A Validade da Citação por Whatsapp no Processo Penal

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16/09/2024 Ampla defesa, Citação Eletrônica, Citação por WhatsApp, CNJ, Direito Penal, Habeas Corpus, Oficial de Justiça, Processo Penal, Resolução 354, STJ, Tecnologia no Direito

A citação é um dos atos mais importantes do processo penal brasileiro, tendo em vista que é um requisito fundamental tanto para a formação quanto para a validade da ação judicial, conforme preconiza o artigo 363 do Código de Processo Penal. 

Neste sentido, o CPP em seu artigo 351 dispõe que “a citação inicial far-se-á por mandado, quando o réu estiver no território sujeito à jurisdição do juiz que a houver ordenado”.

De igual modo, o artigo 357 do mesmo diploma legal prevê que são requisitos fundamentais da citação a leitura do mandado por parte do citando pelo Oficial de Justiça e a entrega da contrafé, cujo documento deverá constar o dia e a hora da citação, bem como a declaração do Oficial na certidão da entrega da respectiva contrafé, com a informação sobre a sua aceitação ou recusa. 

Já a citação ocorrerá sempre de forma pessoal sempre quando o réu estiver preso nos termos do artigo 361 do CPP, não restando dúvidas de que a legislação penal brasileira sempre prioriza que as citações ocorram de forma pessoal, prevendo a citação por edital apenas quando a primeira hipótese restar comprovadamente infrutífera (artigo 361 do CPP) e a citação por hora certa nos casos em que houver suspeita de ocultação do réu para evitar a citação (artigo 362 do CPP). 

Tais dispositivos legais encontram respaldo nos princípios do contraditório e da ampla defesa devidamente previstos no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal, da qual prevê de forma clara que a todos os litigantes sem exceção, seja em processo administrativo ou judicial, bem como aos acusados em geral são assegurados o direito de defesa. 

Contudo, apesar da legislação processual penal ser categórica de que a citação dos réus deve ser preferencialmente realizada de forma pessoal, não se pode negar a força dos debates acerca da possibilidade da citação ocorrer via aplicativo whatsapp, ainda mais após a aprovação da Resolução de nº 354/2020 pelo CNJ em que permitiu a utilização dessa ferramenta para a comunicação dos atos processuais diante da pandemia de Covid -19. 

Não podemos olvidar também do disposto no artigo 3º do Código de Processo Penal, do qual prevê que a legislação penal permitirá a interpretação extensiva e a aplicação analógica, além dos princípios gerais e norteadores do direito, o que abre espaço para a aplicação do Código de Processo Civil, em que muito embora não tenha previsão expressa acerca da citação por whatsapp, dispõe em seus artigos 246 e 247 sobre a possibilidade de citação por meio eletrônico quando a parte estiver previamente cadastrada em sistemas eletrônicos oficiais, bem como sobre o uso de meios eletrônicos para a prática de atos processuais, desde que haja previsão legal ou regulamentar específica.

Logo, é notório que a citação via aplicativo whatsapp ainda é um tema não pacificado, tanto na legislação quanto na jurisprudência, cuja discussão cada vez mais é uma necessidade crescente. 

Jurisprudência sobre a citação por Whasapp no processo penal

No julgamento do Habeas Corpus de nº 641877/DF pelo Superior Tribunal de Justiça ocorrido no dia 09/03/2021, houve o enfrentamento a respeito do uso de tecnologias e da informática no processo penal. 

Neste sentido, em referido julgado o Imo. Relator o Sr. Ministro Ribeiro Dantas informou que seria possível validar a citação desde que o Oficial de Justiça, após se identificar por Whatsapp, pedisse ao acusado o envio da foto de seu documento e de um termo de ciência da citação, assinado a próprio punho, tendo em vista que desta forma o agente público poderia comparar as assinaturas ou por qualquer outro meio em que seja possível assegurar a identidade do destinatário da mensagem por Whatsapp. 

Todavia, no mesmo voto, o Ilmo. Relator também consignou que a mera confirmação escrita da identidade do usuário do Whatsapp não é suficiente para confirmar que o acusado tomou ciência da existência da ação penal, especialmente quando houver a sua foto individual no respectivo aplicativo, de modo que em referido julgado houve a ressalva da existência do direito do acusado contestar a nulidade da citação ainda que todos os elementos estejam presentes, como o número do telefone, a confirmação escrita e a foto individual do acusado.  

Deste modo, com essas ponderações, o Ilmo. Ministro Ribeiro Dantas reconheceu a nulidade da citação por Whatsapp, informando acerca da diferença do processo penal para o civil, tendo em vista que nestes casos é o processo que legitima a pena e que não se pode prescindir do rito processual para se concretizar um direito substantivo, sempre buscando o equilíbrio entre o dever de respeito ao devido processo legal e os avanços tecnológicos da humanidade. 

Tal entendimento também foi firmado no informativo de nº 688 do STJ, cuja ementa dispõe que “é possível a utilização de Whatsapp para a citação de acusado, desde que sejam adotadas medidas suficientes para atestar a autenticidade do número telefônico, bem como a identidade do indivíduo destinatário do ato processual”. 

Por fim, em relação ao STF, não existe, ao menos tão cedo no horizonte sinais acerca do final dos debates sobre a matéria, existindo apenas no momento a Resolução de nº 661/2020 assinada pelo Ilmo. Ministro Dias Toffoli, o qual na época atuava como Presidente do Tribunal, da qual prevê a comunicação institucional entre o STF e as instituições interessadas por meio eletrônico, desde que exista a comprovação tanto do envio quanto da entrega das mensagens e documentos ao destinatário. 

Portanto, apesar de não existir previsão legal acerca da citação por whatsapp no processo penal, o entendimento atual é de que é possível a utilização da ferramenta para a citação do acusado, desde que o Oficial de Justiça se identifique na conversa e peça ao destinatário o envio do termo de ciência da citação devidamente assinado e um documento pessoal com foto com o objetivo de comparar as assinaturas, além da presença obrigatória de três elementos, como o número do telefone, a confirmação escrita e a foto individual do acusado.


Esteja atento aos seus direitos!

Autora: Dra. Juliana Portella Toledo Costa.